Para além do catolicismo: a presença
evangélica em Juazeiro do Norte[1]
Priscila
Ribeiro Jeronimo, URCA[2]
Renata
Marinho Paz, URCA[3]
Resumo:
O objetivo deste trabalho é
apresentar os resultados de uma análise exploratória sobre o campo religioso em
Juazeiro do Norte, com foco no avanço pentecostal. No Cariri, o catolicismo
exerce forte influência, devido à centralidade da figura do Padre Cícero, sendo
evidentes as estratégias de setores políticos e religiosos católicos para
evidenciar uma memória religiosa calcada no catolicismo, baseada nas romarias e
no Padrinho, concebidos como elementos identitários da cidade. Assim, a visão
da presença e expansão de outras religiões é ofuscada, sendo notável a ausência
de estudos sobre a temática, o que torna relevante investigar o caso da
presença evangélica na localidade.
Palavras-chave: Juazeiro do Norte,
análise exploratória, campo religioso, pentecostais.
Abstratc: The aim of this paper is to present the results of
an exploratory analysis on the religious field in Juazeiro, focusing on the
advancement Pentecostal. In Cariri Catholicism exerts a strong influence,
because of the centrality of the figure of priest Cicero, being clear
strategies for political and religious sectors to show a Catholic religious
memory grounded in Catholicism, based on pilgrimages and the centrality of the
Godfather, conceived as identity elements the city. Thus, the view of the
presence and expansion of other religions is overshadowed, was a notable
absence of studies on the subject, making it relevant to investigate the case
of evangelical presence in the locality.
Keywords: Juazeiro, exploratory analysis,religious field ,
pentecostal.
Introdução
Este
artigo tem como objetivo analisar a presença evangélica em Juazeiro do Norte,
em especial, os evangélicos pentecostais, um dos segmentos religiosos de maior
ascendência no Brasil. Esta análise pretende contribuir para a construção de
uma visão mais aprofundada e ampliada do campo religioso na região Cariri, em
especial em Juazeiro do Norte, considerando outras formas de crenças, práticas
e representações religiosas, contemplando, sobretudo, a exploração e análise do
crescimento dos pentecostais na cidade.
Juazeiro é uma cidade que vive política, econômica e
religiosamente em torno da figura do Padre Cícero, personagem influente que
transformou essa terra em um espaço sagrado do catolicismo popular. Diante
desse quadro de hegemonia do catolicismo, estudos sobre as demais expressões
religiosas na cidade são praticamente inexistentes, a despeito da expressiva
produção acerca dessa temática no país e na América Latina.
Este
estudo insere-se num panorama mais amplo, e que pode ser considerado tomando-se
por base os dados dos Censos das últimas quatro décadas, que revelam que esse
crescimento não é recente, e denotam ainda que a religião dos brasileiros não
pode ser mais considerada com base na exclusividade do catolicismo. Conforme
Sanchis:
Há duas ou três
gerações, falar em “religião dos brasileiros” seria apontar quase que
exclusivamente para o catolicismo. Isso mudou. Hoje o catolicismo constitui
cada vez mais uma das religiões, entre outras, dos brasileiros, e num movimento
diversificador que se acelera. Não se trata só de números (...), mas de algo
qualitativo, de um problema identitário. (SANCHIS, 2001, p. 10)
O Censo 2000, mostra as transformações em relação à
religiosidade dos brasileiros, sintetizadas no gráfico abaixo:

O número de
católicos diminuiu consideravelmente, principalmente na última década, o número
de evangélicos cresceu, e os sem religião também cresceram, reformulando um
quadro das religiões no Brasil.
É importante observar que evangélicos, de acordo com o Censo
2000, englobam protestantes históricos e pentecostais. Na denominação dos
protestantes há um pequeno crescimento, mas a expressão dos evangélicos que
ascendem mais são os pentecostais. Dentro do campo pentecostal, a denominação
que cresce mais são os neopentecostais, que agregam e ressignificam as
particularidades das outras ondas, tais como: os dons do Espírito Santo (do
pentecostalismo clássico) e a cura (dos deuteropentecostais).
A construção pentecostal no Brasil
O pentecostalismo nasceu no Brasil,
em 1910, com a criação da Igreja Congregação Cristã, fundada pelo italianao
Luigi Francescon que, antes de chegar ao Brasil, adquiriu características do
movimento holiness nos Estados
Unidos, que batizavam as pessoas no Espírito Santo (ANTONIAZZI, 1994,
p.67-158). A segunda igreja pentecostal foi a Assembléia de Deus, fundada no
Brasil por missionários suecos e instalados em Belém (PA), constituindo-se na
maior igreja pentecostal do país (MARIANO, 2010, p. 24). Essas duas
denominações baseiam-se no batismo no Espírito Santo, e são denominadas de
pentecostais clássicas, devido a seu caráter pioneiro no Brasil.
A segunda onda, ou o
deuteropentecostalismo, instituiu o movimento de cura no país, e é formada
pelas igrejas: Evangelho Quadrangular, Brasil para Cristo e Deus é amor. A
terceira onda, ou neopentecostais, é formada no fim da década de setenta e hoje
tem como alguns de principais expoentes as igrejas Universal do Reino de Deus,
a Internacional da Graça, a Renascer em Cristo, a Mundial do Poder de Deus,
entre outras, formando uma vertente assentada na tríade:
cura-exorcismo-prosperidade. Os evangélicos pentecostais possuem muitas
denominações, cada uma com uma característica, um jeito de ser.
Essas ondas modificaram e ressignificaram o movimento
pentecostal em nosso país. Sobre esse crescimento, Mariano afirma que:
No
Brasil, a expansão pentecostal não é recente nem episódica. Ocorre de modo
constante já há meio século, o que permitiu que o pentecostalismo se tornasse o
segundo maior grupo religioso do país. (...) o pentecostalismo vem conquistando
crescente visibilidade pública, legitimidade e reconhecimento social. (MARIANO,
2004, p.121)
É
interessante notar que, no início dos anos noventa, as religiões que se
enquadravam fora do que se considerava como a estrutura central do campo
religioso no Brasil, ou seja, católicos ou protestantes, eram vistos como seitas, com uma certa acentuação pejorativa.
Na coletânea Sinais dos tempos
(1989), por exemplo, vários artigos utilizavam a denominação seita como algo
separado, fora do lugar, reificando uma interpretação calcada na estrutura
acima mencionada sobre as outras denominações religiosas. Essa leitura católica sobre o pentecostalismo deriva,
principalmente da pregnância simbólica que o catolicismo representa, como uma
religião que influencia matricialmente a constituição das outras religiões.
Para isso diz Sanchis:
É a existência de
uma referência generalizada ao cristianismo, talvez mais ainda ao catolicismo. Referência certamente resultante
de imposição histórica (...) enquanto condição de entendê-la como universo
simbólico cuja marca é em toda parte detectável (...). É bastante comum os
pesquisadores ficarem impressionados por esta presença continuada, polivalente
conforma as regiões geográficas e sociais, de uma pregnância- influência
dominadora. (SANCHIS, 2001, p.19. Grifos nossos)
Brandão
(2004) afirma a existência uma estrutura que caracteriza o campo religioso no
Brasil, no qual se pode ver essa influência dominadora da religião católica,
ficando ela e o protestantismo histórico no centro; o candomblé, a umbanda, o
espiritismo e o pentecostalismo do lado esquerdo dessa estrutura, e as culturas
minoritárias, os judeus e os budistas, do lado direito. Essa estruturação
proposta por Brandão pretende mostrar que as religiões que não se encontram no
centro são percebidas no imaginário religioso popular, muitas vezes, como falsas religiões, principalmente para o
catolicismo, que acredita existir uma fronteira simbólica entre ele e as demais
religiões.
Essa
estrutura pouco se modificou, o que se observa é a mudança na dinâmica deste
campo, devido a constituição de um mercado
religioso, que tem como um de seus traços distintivos, a degradação das
identidades herdadas (HERVIEU-LÉGER, 2008); as pessoas podem transitar com
relativa liberdade entre as religiões que desejarem, como também podem unir
práticas distintas. Observa-se essa dinâmica no continente latinoamericano,
onde a pluralização religiosa é algo em expansão, e o pentecostalismo aparece
como religião crescente, que sintetiza elementos modernos e populares (SÉMAN, 1997).
O
pentecostalismo se fortificou, usando do sincretismo, contribuindo para a
reelaboração do caldo da religiosidade brasileira. Nesse sentido, os
neopentecostais, sobretudo, absorvem, se apropriam e ressignificam elementos
das religiões afro e do catolicismo popular, e se utilizam disso para combater
essas crenças. Com isso, principia-se o estabelecimento de uma alternativa
cultural e política, o que reformula o lugar dos pentecostais na dinâmica
religiosa brasileira. Quanto mais o Brasil torna-se pentecostal, mas o
pentecostalismo se torna brasileiro; entenda-se: semelhante e constituinte do
caldo “católico-afro-kardecista” (ALMEIDA, 2008), onde se pode pensar em uma
construção de uma cultura pentecostal, que sincretiza e reelabora o seu lugar
nessa dinâmica.
Os neopentecostais constituem uma vertente que usa a tríade:
cura- exorcismo-prosperidade. Os fiéis buscam, no dia do exorcismo, a libertação face a espíritos, demônios, doenças,
mal olhado, problemas afetivos, espirituais e materiais e, através do
exorcismo, elas acreditam se curarem.
Seus
cultos basearem-se na oferta especializada de serviços mágico-religiosos, de
cunho terapêutico e taumatúrgico, centrado em promessa de concessão divina de
prosperidade material, cura física e emocional e de resolução de problemas
familiares, afetivos, amorosos e de sociabilidade. Oferta sob medida para
atender as demandas de quem crê que pode se dar bem nessa vida e neste mundo
recorrendo a instituições intermediárias e de forças sobrenaturais. (MARIANO,
2004, p. 124)
A prosperidade é outra base dessa tríade neopentecostal. Essas
igrejas funcionam como empresas, onde o fiel é um sócio de Deus, que paga seus
dízimos, para receber algo em troca. Segundo essa teologia, baseada num toma-lá-cá, o acordo que o fiel faz,
tem que ser realizado no presente, no aqui e agora. Essa peculiaridade das
neopentecostais contribui para uma maior integração entre igreja e comunidade,
que inclui as pessoas em suas práticas, pois o fiel sempre encontra a igreja
aberta, e sempre existe um culto com horários flexíveis, um pastor, um obreiro
que está disponível para esse fiel. Essa integração gera um sentimento de
pertença no fiel, além de possibilitar uma maior sociabilidade, fazendo com que
os fiéis se identifiquem com a igreja, com o que ela apresenta como princípios
e valores, compartilhando esse sentimento em comum, gerando o vínculo do
indivíduo com a igreja.
Essas igrejas chamam bastante atenção, principalmente por causa
do elemento prosperidade, sendo muito
criticadas em relação a essa nova teologia de fé. As outras igrejas, que
apresentam uma afinidade negativa com essa perspectiva de prosperidade,
principalmente a igreja católica, criticam e põem um olhar etnocêntrico sobre
ela. Alguns autores, como Landim (1989),
por exemplo, também conferem certa tônica negativa, categorizando os fiéis como
vítimas dessas igrejas, atribuindo um olhar pejorativo sobre os
neopentecostais.
Diante desse quadro, autores como Lemuel Guerra, afirmam que:
A
lógica mercadológica sob a qual a esfera da religião opera produz, entre outras
coisas, o aumento da importância das necessidades e desejos das pessoas na
definição dos modelos de práticas e discursos religiosos a serem oferecidos no
mercado. Ao mesmo tempo, demanda das
organizações religiosas maior flexibilidade em termos de mudanças de seus “produtos”
no sentido de adequá-los da melhor maneira possível para a satisfação da
demanda religiosa dos indivíduos. (GUERRA, 2003, p. 01)
É nessa
lógica que é produzido um ethos do consumo espiritual, onde os segmentos
religiosos mostram afinidades que são compatíveis com o que o fiel- consumidor
procura. Por isso o neopentecostalismo inova, assim como outras igrejas, que
hoje vêem esse crescimento da oferta de bens religiosos para o consumo
imediato. As igrejas neopentecostais promovem um leque de atividades para as
demandas dos fiéis como, por exemplo, possuir um dia especial para cada culto,
como o dia da prosperidade, o dia do exorcismo, o dia da família, aonde o fiel
ou freqüentador vai e encontra o que deseja consumir satisfazendo, assim, suas
diferentes necessidades.
Juazeiro do Padre Cícero
Entre
os centros de romaria brasileiros, poucos rivalizam com a quantidade de devotos
que afluem a Juazeiro do Norte.[4]
Eminentemente populares, a singularidade das romarias a Juazeiro reside no fato
de que configura um movimento fundado numa heresia, baseado na devoção a Padre
Cícero, um santo não canonizado oficialmente pela igreja católica. Para o
devoto, Padre Cícero é tudo:
(...) santo,
patriarca, padrinho, profeta, padre, político, conselheiro, pai, amigo, médico,
modelo, mediador, intercessor, chefe, homem de oração e de ação, promessa,
nostalgia do passado, esperança de um futuro melhor, o ancestral, enfim, suas
próprias raízes (GUIMARÃES, 1983, p. 287. Tradução minha).
As
romarias a Juazeiro do Norte foram engendradas em fins do século XIX, em torno
da questão religiosa decorrente dos milagres
da hóstia, envolvendo o padre Cícero, a beata Maria de Araújo e a hierarquia
eclesiástica. De pequeno vilarejo, que nesse período era apenas um distrito do
município do Crato, à condição de maior cidade da região centro sul do Estado
do Ceará, capitaneando a chamada Região Metropolitana do Cariri (que engloba
também os municípios de Crato e Barbalha), Juazeiro do Norte erigiu-se em torno
da figura e da centralidade do Padre Cícero e das romarias em sua devoção. Não
é exagero afirmar que Juazeiro vive e cresce em função desses dois elementos,
que engendram uma ampla mobilização em termos econômicos, políticos, sociais e
culturais [5],
conferindo ao Cariri ampla visibilidade.
Ao
longo de sua história, Juazeiro ou, melhor dizendo, a região do Cariri
constituiu-se num espaço de
afluência de
um imenso caleidoscópio de práticas sócio-religiosas e culturais, que vieram
junto com os romeiros, provenientes dos vários estados nordestinos. No Cariri
encontra-se um verdadeiro caldo composto pelos valores, pelas identidades,
enfim, pela cultura de uma parcela expressiva da população brasileira. Tudo
isso confere à região um lugar de destaque na paisagem cultural não só
sertaneja, mas também nacional.
Uma das faces mais evocadas é o
Cariri da religiosidade popular, ancorada no catolicismo, resultado talvez do
esforço de construção de uma forma unívoca de representação, visando a
reafirmação de uma identidade caririense. Nesse esforço, o padre Cícero assume
um papel basilar, por se constituir no cerne de uma das maiores romarias da
América Latina, atraindo anualmente cerca de dois milhões de pessoas.
De
um modo geral, os trabalhos sobre Juazeiro e padre Cícero tendem a reafirmar um
discurso pautado na catolicidade da
região, servindo de base para a retórica da própria igreja católica e de
setores interessados nas romarias, tais como poderes públicos municipais e
estaduais, que vêm, de forma bastante incisiva, sobretudo na última década,
afirmando a figura do padre Cícero como central, através das ações de
especialistas que tentam mobilizar uma “memória religiosa”, baseada na história
do Padrinho e da presença da Igreja católica no engendramento de Juazeiro.
Evidentemente
outros elementos também contribuíram diretamente para essa ênfase – afinal não
se deve perder de vista que as romarias e o próprio Padre Cícero foram,
paradoxalmente, alvo de um intenso combate quase secular, tanto por parte da
igreja católica, quanto pelas elites locais.
Entre esses elementos destacam-se as alterações promovidas por alguns
setores da igreja católica, fundadas na perspectiva multiculturalista
pós-conciliar, a concorrência no mercado religioso derivada, sobretudo, do
avanço pentecostal, e dos fortes interesses econômicos e políticos que envolvem
as romarias[6].
Ao
se questionar os limites dessa catolicidade, não se pretende, obviamente, negar
o peso da presença e força católica na região, especialmente em Juazeiro do
Norte. Os dados do último censo realizado pelo IBGE em 2000 revelam que a
população católica em Juazeiro é de 93,8%, ao passo que os evangélicos, por
exemplo, somam 4,48%. Mas as projeções para o ano de 2007 (há quase meia
década, portanto), revelam uma expectativa de crescimento para 10,4% da
população evangélica na localidade[7].
Paralelamente, há que se considerar a presença efervescente de diferentes
religiões e sistemas espirituais de sentido. Aqui, pelo menos duas
questões-chave podem ser colocadas: até que ponto essa predominância católica
não mascara um mundo fervilhante de crenças e práticas religiosas? Essa mesma
predominância também não tende a subjugar a presença e o avanço pentecostal,
considerado o fenômeno religioso mais notável no campo religioso brasileiro
contemporâneo?
Análise exploratória do campo religioso da cidade
A
pesquisa “A fé que se move: avanço pentecostal em Juazeiro do Norte (CE)”, é um
estudo pioneiro que vem sendo desenvolvido há nove meses, e aponta alguns
elementos de interesse para a compreensão do campo religioso em Juazeiro do
Norte. Trata-se de uma exploração ainda em curso, realizada no âmbito do
Programa de Iniciação Científica da Universidade Regional do Cariri (URCA),
vinculada ao Núcleo de Estudos Regionais (NERE) desta instituição, financiada
pelo CNPq.
Este
trabalho de exploração do campo religioso em Juazeiro do Norte teve início com
o levantamento, sem sucesso, de dados junto a órgãos públicos e instituições
oficiais de diferentes naturezas acerca da presença das igrejas evangélicas
pentecostais no município. Diante desse quadro, optou-se por buscar as
informações a partir de contatos diretos com as lideranças das igrejas, a
partir do método de investigação bol.
Para obter as informações acerca da localização das igrejas foi preciso bater de porta em porta, visitando uma
igreja de uma denominação, e com isso, obter o endereço de outras.
A
partir daí, construiu-se um quadro com as igrejas encontradas em Juazeiro e
passou-se buscar elementos pertinentes a sua configuração sócio-econômica (VER
ANEXO 1). Até o presente momento existem na cidade:
quarenta e uma Assembléias de Deus, sendo trinta e três do Templo Central; seis
do Montese; uma da Bela Vista, e uma Quinzanga para o Rio de Janeiro; dezenove
Congregações Cristãs; duas Deus é Amor; duas Família Viva; uma Betel; uma Deus
Revelado Missão; uma Ide e Pregai; uma Cristã Manacial Fonte de Vida; uma
Assembléia de Deus Manain; uma Betesda; uma Renascer; três Universais do Reino
de Deus; uma Internacional da Graça, uma Mundial do Poder de Deus.
Todas as igrejas neopentecostais (Universal, Internacional e
Mundial) estão localizadas no centro da cidade. No entanto, a maior parte das
igrejas se encontra nos bairros Tiradentes, Franciscanos e Triângulo, sendo
interessante notar a presença das igrejas Assembléia de Deus e Congregação
Cristã no bairro Horto, um espaço sagrado, local de residência tradicional e
preferencial de romeiros que decidem se fixar na cidade, pois no local se
encontra a estátua do Padre Cícero.
Com esse mapeamento, até o momento, foram realizadas visitas à
Assembléia de Deus (Templo Central e Montese), Família Viva, Universal do Reino
de Deus, Internacional da Graça, Mundial do Poder de Deus, Ide e Pregai. No
decorrer dessas observações foi verificada a periodicidade dos cultos, os temas,
e a configuração das características específicas de cada uma delas. Foram
realizadas entrevistas estruturadas e semi-estruturadas, além de conversas
informais com os fiéis e lideranças religiosas, de modo a contribuir para a
construção do perfil sócio-econômico de algumas denominações.
É interessante notar que todas as igrejas visitadas foram
acessíveis, algumas com certo receio, como a Universal, que teme fornecer
informações e essas serem transformadas em algo que denigra a imagem dos fiéis
e da igreja, mas que, com a paulatina freqüência dos pesquisadores, acabou
viabilizando aproximação face à pesquisa. Outras foram mais abertas,
disponibilizando, como exemplo, a ficha de membros, como as igrejas
Internacional da Graça e Ide e Pregai.
Foram aplicados questionários (VER ANEXO 2), junto aos fiéis de
três igrejas: Assembléia de Deus Templo Central, apresentando os seguintes
resultados preliminares: uma predominância feminina (64% ), jovem (68% na faixa
etária de quinze a trinta e cinco anos) e de baixa renda (64% têm renda de um a
dois salários mínimos), com ocupações diversas, tais como: estudante,
domésticas, professores, comerciários, operários, entre outros. Em relação à
religião dos progenitores, há uma predominância de pais católicos e mães evangélicas.
A maioria é de católicos que se converteram, e a maioria simpatiza por igrejas
evangélicas do protestantismo histórico, como a Batista e do
neopentecostalismo, como a Internacional da Graça.
Esse levantamento preliminar também foi feito na igreja Deus é
Amor, onde há poucos fiéis (apenas cinqüenta fiéis, das duas denominações que
existem na cidade). Dos entrevistados, a maioria era de mulheres, sendo que a
maior parte dos membros (80%) possui idade acima de trinta e seis anos e nível
de renda bastante baixo (90% com renda inferior a dois salários). Em relação à
religião dos pais, há predominância de pais e mães católicos, sendo notável
também a conversão dos católicos para essa igreja. Mas é interessante notar que
esse movimento não é, necessariamente, linear (na direção
catolicismo-pentecostalismo). Numa das conversas com os entrevistados, um deles
afirmou: Eu venho para a igreja por que a
minha mulher gosta, e eu acompanho, mas depois eu volto para a nossa igreja.
(Entrevista com um fiel da igreja Deus é Amor, realizada no dia 17/04/2011, em
Juazeiro do Norte) O entrevistado se referia ao catolicismo, e em sua
colocação, é importante ver o movimento de trânsito religioso, pois mostra que
o processo de conversão não acaba as possibilidades dos fiéis de voltarem, ou
mudarem de opção religiosa.
Na igreja Ide e Pregai (que conta com cerca de oitenta e cinco
fiéis), dos entrevistados, 60% de mulheres e 40% de homens, com 70% com idade
acima de trinta e seis anos, onde 70% possuem renda superior a três salários;
90% dos pais são da religião católica, e as mães 60% são católicas.
A maioria dos entrevistados gosta das igrejas por que foi onde
se encontraram com Deus, por que se identificam com a doutrina e com a
interpretação do evangelho. O pertencimento a essas igrejas os fariam ver
melhor a vida, porque são igrejas verdadeiras. Esses elementos puderam ser
observados de maneira intensificada, por exemplo, em uma cerimônia de batismo
Assembléia de Deus Templo Central, em que uma fiel disse se batizar por buscar a salvação, por que eu não me lembrava como
eu tinha sido batizada, e agora eu tenho consciência do meu batismo, da minha
escolha. Indagada sobre o que representava o batismo, a mesma senhora
respondeu: Jesus me tocou, me chamou, era
um desejo, em conhecer a verdade.[...] Uma
emoção muito forte, eu creio e ele nunca vai sair de mim, eu me renovei, entrei
em uma nova vida. (Entrevista realizada em 28/11/2010).
De acordo os dados preliminares obtidos, pode se perceber a
figura do convertido em Juazeiro do Norte. Essa figura, segundo
Hervieu-Léger (2008), a partir da crise de identidades religiosas herdadas,
viabiliza um favorecimento da circulação dos crentes em busca de uma identidade
religiosa a qual se adequem melhor. Esse processo, que está ocorrendo gradativamente
na cidade, a partir da presença e da visibilidade cada vez mais expressiva dos
crentes, aponta para o esfacelamento e a possibilidade de reconstrução das
identidades herdadas fora dos marcos do catolicismo, já que a maioria dos
entrevistados nasce na religião católica, mas procuram alternativas religiosas,
e o pentecostalismo aparece como um segmento que se multiplica de maneira
significativa na cidade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Livro:
ANTONIAZZI,
Alberto... I et al. I Nem anjos nem demônios: interpretações sociológicas do
pentecostalismo. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.
GUIMARÃES,
Therezinha Stella. Étude psychologique de la function d’un saint dans
El catholicism populaire – Pe. Cícero et la
religion du nordestin (Brésil).Louvaine: UCL, 1983.
HERVIEU-LÉGER,
Danièle. O peregrino e o convertido: a religião em movimento; tradução de João
Batista Kreuch. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
MARIANO,
Ricardo. Neopentecostais. Sociologia do novo pentecostalismo no Brasil. SP:
Loyola, 2010.
SANCHIS, Pierre.
Fiéis e cidadãos. Percursos de sincretismo no Brasil. RJ: EDUERJ, 2001.
Organização de livro:
LANDIM, Leilah
(Org.). Sinais dos tempos. Igrejas e seitas no Brasil. RJ: Instituto de Estudos
da Religião (ISER). RJ, 1989.
Artigo:
BRANDÃO, Carlos Rodrigues.
“Fronteira da fé- alguns sistemas de sentido, crenças e religiões no Brasil de
hoje”. Estudos avançados. vol.18, n°. 52, São Paulo, setembro a dezembro de
2004.
MARIANO, Ricardo. Expansão
pentecostal no Brasil: o caso da Igreja Universal. Estudos avançados. vol.18,
n°. 52, São Paulo, setembro a dezembro de 2004.
SEMÁN, Pablo.
“Religión y cultura popular em la ambígua modernidade Latinoamericana”. In: Nueva Sociedade Nro. 149.
Maio-Junho, 1997, p.130-145.
Artigo na internet:
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In: Revista de Estudos da Religião-REVER. ISSN: 1677- 1222. Disponível em: < www.pucsp.br/rever/rv4_2008/t_almeida.pdf>>.
Acesso em 01/11/10.
GUERRA, Lemuel. As influências da
lógica mercadológica sobre as recentes transformações na Igreja Católica. In:
Revista de Estudos da Religião-REVER. ISSN: 1677- 1222. Disponível em: < www.pucsp.br/rever/rv2_2003/p_guerra.pdf >.
Acesso em 29/09/10
[1] Trabalho apresentado no
XII Simpósio da ABHR, 31/05 – 03/06 de 2011, Juiz de Fora (MG), GT (19): Protestantismos
e pentecostalismos na modernidade.
[2]
Bacharelanda em Ciências Sociais na Universidade Regional do
Cariri-URCA. Bolsista de Iniciação Científica do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico-CNPq.
[3] Doutora em Sociologia pela
Universidade Federal do Ceará-UFC. Professora
adjunta da Universidade Regional do Cariri-URCA e coordenadora do Núcleo de
Estudos Regionais desta instituição.
4 O calendário religioso das
romarias é composto por quatro grandes ciclos: as romarias de Natal e Reis, em
fins de dezembro e início de janeiro; a romaria de Candeias, em fins de
janeiro/início de fevereiro; a romaria de Nossa Senhora das Dores, padroeira da
cidade, em meados de setembro e a romaria de Finados, em fins de outubro/início
de novembro. Entretanto, além desses ciclos, há outras datas que costumam
atrair um fluxo significativo de romeiros, como a Semana Santa e os
aniversários de nascimento e morte do Padre Cícero.
5 Para maiores informações sobre a história de
Juazeiro do Norte, Padre Cícero e as romarias, ver DELLA CAVA (1976); OLIVEIRA
(1998); ALENCAR (2005); PAZ (2005), entre outros.
6 Ver PAZ (2005).
7 Projeções elaboradas pelo MAI (Ministério de Apoio
com Informação). In www.mai.org.br (acesso
em 22/06/09)
8 Informações retiradas do site: http://www.juazeiro.ce.gov.br/index.php?Pasta=paginas_site&Pagina=pag_cidade&MenuDireito=1
ANEXO 1: INFORMAÇÕES
SOBRE OS ENDEREÇOS POR BAIRRO CONSEGUIDOS COM O MAPEAMENTO, ATÉ O PRESENTE
MOMENTO.
Juazeiro
do Norte se encontra no Sul do Estado do Ceará, distante
cerca de 560 km de Forta-leza, pela BR 116. É a maior cidade do interior
cearense, a área do município é de 249 km2. Faz limite ao norte, com Caririaçu; ao sul, com Barbalha; a
leste, com Missão Velha e a oeste, com Crato, possui cerca de 250 mil habitantes[7],
tem 29 bairros, e 2 distritos.
As
igrejas mapeadas, até o presente momento, localizam-se da seguinte maneira:
CENTRO:
Igreja
Universal do Reino de Deus
Igreja
Pentecostal Betesda
Grupo de Comunhão e Desenvolvimento Igreja Apostólica Renascer
Igreja
Internacional da Graça de Deus
Igreja
Mundial do Poder de Deus
Assembléia
de Deus Templo Central
Assembléia
de Deus Montese
Deus é Amor
TIRADENTES:
Igreja
Universal do Reino de Deus
Três Igrejas
Assembléias de Deus Templo Central
Congregação Cristã
TRIÂNGULO:
Igreja
Universal do Reino de Deus
Assembléia
de Deus Templo Central
Congregação Cristã
Família Viva
FRANCISCANOS:
Assembléia
de Deus Templo Central
Congregação Cristã
ROMEIRÃO:
Assembléia
de Deus Templo Central
Congregação Cristã
FREI DAMIÃO:
Três
Assembléias de Deus Templo Central
Assembléia
de Deus Montese
CASAS POPULARES:
Assembléia
de Deus Montese
Assembléia
de Deus Quinzanga para o Rio de Janeiro
SANTA TEREZA:
Assembléia
de Deus Templo Central
Família Viva
Assembléia
de Deus Manain
NOVO JUAZEIRO:
Assembléia
de Deus Templo Central
SÃO JOSÉ:
Quatro
Assembléias de Deus Templo Central
Assembléia
de Deus Montese
JOÃO CABRAL:
Assembléia
de Deus Templo Central
Assembléia
de Deus Montese
Deus
é Amor
ANTONIO VIEIRA:
Igreja
Pentecostal Betesda
Assembléia
de Deus Templo Central
Congregação Cristã
LIMOEIRO:
Assembléia
de Deus Bela Vista
MULTIRÃO:
Duas Congregações
Cristãs
AEROPORTO:
Congregação Cristã
Igreja Deus Revelado Missão
HORTO:
Assembléia
de Deus Templo Central
Congregação Cristã
SALESIANOS:
Congregação Cristã
JUVÊNCIO SANTANA:
Assembléia
de Deus Templo Central
Congregação Cristã
BETOLÂNDIA:
Congregação Cristã
LEANDRO BEZERRA:
Assembléia
de Deus Templo Central
Congregação Cristã
TIMBAÚBAS:
Igreja Ide e Pregai Renovada
Assembléia
de Deus Templo Central
Assembléia
de Deus Montese
CAMPO ALEGRE:
Congregação Cristã
JARDIM GONZAGA:
Assembléia
de Deus Templo Central
PEDRINHAS:
Assembléia
de Deus Templo Central
JARDIM GONZAGA:
Assembléia
de Deus Templo Central
JOSÉ GERALDO DA CRUZ:
Congregação Cristã
VILA TRÊS MARIAS:
Assembléia
de Deus Templo Central
VILA NOVA:
Assembléia
de Deus Templo Central
SÍTIO LEITE:
Assembléia
de Deus Templo Central
Congregação Cristã
SÍTIO SÃO GONÇALO:
Congregação Cristã
SÍTIO UMARI:
Congregação Cristã
PIRAJÁ:
Igreja Cristã Manancial Fonte de Vida
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